segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

DayByDay (#10) - São olhos que voam e navegam...

Declamávamos palavras escritas sorrindo de forma audível permanecendo estáticos a cada letra e a cada palavra. É certo que o que aconteceu foi um resultado positivo daquilo que une o feito e o dito. Se por um lado tratei da primeira parte, trataras tu, entusiasticamente, da segunda. Foi um dos momentos em que os meus olhos voaram, divagaram e deambularam num caminho que percepcionei para mim... um caminho em que a minha mão estava agarrada e com ela, o coração. 


Estranha forma de começar a escrever sobre algo que não estruturei previamente. Cada caminho que opto por seguir na próxima linha é pensado no exato momento em que é escrito. Interpolo aqui um pensamento que me ocorreu: "Falta ser declamado".
   Tirava eu os óculos, depois de pousar o aparelho electrónico com que líamos algumas passagens deste pequeno espaço, quando os meus olhos deixaram de voar e passaram a navegar sem rumo certo. Verdade! Acontece-me sempre por mais certo que esteja daquilo que queira olhar. Olhar nos olhos é uma expressão que não resulta com qualquer pessoa (check), sou essa pessoa. Não vejo isso como um problema mas sim como uma particularidade. Uma entre as muitas que me acompanham! Não partilho todas ao mesmo tempo para não me sentir fragmentado nem dar a entender, falaciosamente, de que o estou.
   Sinto-me surpreendido de estar aqui. Sinto-me surpreendido pelo contexto pelo qual estou aqui. Sinto-me surpreendido da evolução desde o último Ferrero Rocher que comi (e que não correu muito bem); Sinto-me em mim e isso é uma conquista. 
   Falava eu, antes de me perder em devaneios - coisa habitual - sobre uma das minhas particularidades. Ora, surpreendeu-me a abordagem com que poderia tratar este assunto. A profundidade de não ter um único foco de visão vai além de um contexto patológico com o seu termo técnico-científico. Acrescento de que dos ante-citados ser-me-ia bem mais fácil falar. 
   A ausência com que pareço olhar é meramente uma característica. Quando a custo se tenta algo é porque se justifica a tentativa. Quando há entrave ao que desejámos fazer, tentamos ainda mais... e só o fazemos se realmente sentirmos total necessidade disso. Enquanto rapaz com esta característica nem sempre sinto vontade de focar as coisas sem óculos. O mais fácil é colocá-los de volta e seguir. (Estou a sorrir enquanto escrevo estas frases que só em mim denoto que farão sentido!). Avanço com o raciocínio,.. quero efetivamente dizer que olhos que navegam perdem-se com mais facilidade. Há uma vastíssima área de um longo mar para explorar. Perco-me! Sinceramente perco-me! Perco-me porque ousei! 
   Ousar é ir além de um pressuposto tomado como certo e por isso sei que Ouso sempre que tento voar e navegar ao mesmo tempo. 
    
  Venham mares, oceanos infindos ou que volte o enormíssimo Pantalassa, pois enquanto me perder ao teu lado, não sentirei medo das consequências. 

É de olhos que voam que escrevo, esperando navegar em breve ao teu lado. 



   

1 comentário:

  1. Ler este texto me faz revisitar arquivos da memória que lá sempre estarão. Assim como a música me faz revisitar paisagens de outrora, como a literatura me faz revisitar momentos de outrora. É sempre bom manter em nós as melhores lembranças contra o esquecimento, contra o rio do esquecimento - aquele mesmo rio Lếthê da mitologia grega em que, no Hades, quem atravessasse o rio esquecia, ao ter contacto com a água.

    No bailado do olhar, vemos o que está exposto a nossa frente, vemos o que está encoberto. Ver é contemplar. Ver é sentir. Ver é estar. Estar sendo. Ver algum objecto, ver nenhum objecto. Ninguém vê o mesmo objecto da mesma maneira. Cada um lança um olhar, um novo olhar. Porque ver é subjectividade. Cada olho carrega sua história, cada olho carrega suas memórias, cada olho carrega o rio Lete que tem.

    A tónica com a qual você termina o texto é deslumbrante. Pois exige-se muita força para navegar, para sair da zona de conforto. Só os corajosos saem das suas zonas de conforto. Claro, sair desta zona de conforto é sempre um risco. O Zaratustra de Nietzsche ao descer das montanhas e anunciar à humanidade o «super-homem» pagou este risco. O que se ganha ao sair dessa zona de conforto, mesmo com risco de perder-se? Na minha opinião: ganha-se a vida. O medo e a covardia aprisionam o Ser nesta zona de conforto. Uma vida de medo é uma outra vida. É um viver sem estar vivendo. É um estar sem estar sendo. Não sei se isto ecoará entendimento do outro lado que me lê. Deixo uns versos de um poema de Álvaro de Campos que melhor ilustram isto que é arriscar navegar, isto que é arriscar sair desta zona, isto que é levar a vida como risco:

    «óóóó — óóóóóóóóó — óóóóóóóóóóóóóóó
    (O vento lá fora)»


    Com os melhores cumprimentos.
    Do seu,

    rodrigo.

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